Underwomb

O quotidiano, frenético, convida cada vez mais a viver à superfície e ao afastamento da natureza. (Sobre)vive-se a era de alterações profundas - pessoais, estruturais, climáticas - em que tudo parece ser superficial. Este viver à superfície atua como jangada da sobrevivência, impedindo o mergulho e a profundidade. Ao espectador, pretende-se assim proporcionar uma experiência imersiva, mergulhando-o num oceano visual e sonoro e transportando-o para um espaço submerso/imerso, calmo, puro e descontaminado. A água - elemento fundamental para a vida na Terra - é o elemento alfa, em toda a ambiguidade que em si enceta: Umas vezes calma, outras agressiva. Umas vezes lúcida, outras obscura. Umas vezes límpida, outras contaminada. Na sua superfície, flutuam todo o tipo de possibilidades, bem como na sua profundidade. O mesmo acontece connosco, somos líquidos como a água e à sua semelhança, também congelamos, evaporamos, secamos. Por vezes calmos, outras agressivos. Por vezes lúcidos, outras soturnos. Por vezes puros, outras maculados. Neste mundo líquido e cada vez mais poluído, afogamo-nos, emergimos novamente, flutuamos, deslizamos e andamos à deriva, umas vezes somos devorados e outras somos os predadores. Assim é a natureza das espécies de hoje, líquidas e inconstantes como a água, onde tudo muda rapidamente. A ideia base desta peça é criar/representar um lugar imersivo, conjugando diversos estímulos visuais e sonoros, numa sala totalmente escura, preenchida com telas em tule branco de uma parede a outra e agitadas com uma ventoinha. O espectador é convidado a entranhar- se na peça, circulando por entre as ondas/telas e originando efeitos visuais com a sua própria sombra. Esta alusão ao meio aquático pretende também criar uma sensação de retorno, de regresso ao íntimo do primeiro segundo da existência, ao eu inicial, ao berço uterino. Das águas nascemos e nelas nos reencontramos.